Não era lá essas coisas, mas para as pequenas cidades da
roça era uma grande atração. Quando as carretas apontavam na estrada, com as
cabines pintadas e os animais na jaula, chegavam à novidade e a alegria.
O que mais chamava atenção eram os elefantes. O maior deles
era o Valdir, um animal vindo da Índia, país onde os elefantes são sagrados e
adorados como deuses. Quando criança, elefantinho ainda, ele via seu pai
desfilar enfeitado pelas ruas e gente de todo o tipo ajoelhada a lhe pedir
favores.
A religião hindu é mais uma armadilha do diabo para enganar
os incautos. Ensina que as almas reencarnam e seguem um processo de evolução. São
milhares os deuses que se originam desse entendimento completamente contrário à
Palavra de Deus.
Pela força do destino, o paquiderme foi vendido ainda jovem
e acabou vindo de navio para o Brasil. Como era orgulhoso, nunca aprendeu
nenhum truque. Aliás, nem sequer deu a mínima atenção aos tantos treinadores
que teve.
Assim, o elefante indiano foi sendo empurrado de circo em
circo, até que terminou sem grandes privilégios, num bem modesto, de interior,
onde o Tonhão, um elefante africano e muito humilde, fazia sucesso e acabava
trabalhando pelos dois.
- Você é ridículo, Tonhão. Jamais me sujeitarei a este papel
de elefante de circo. Fique sabendo que sou um animal sagrado, um deus
reencarnado- dizia o presunçoso Valdir.
Para não dizer que Valdir era inútil, o dono do circo, que
sabia da total apatia do animal, oferecia um prêmio em dinheiro para quem
conseguisse fazê-lo sentar, que é o truque mais elementar para um elefante
amestrado.
Os candidatos puxavam a corda amarrada no pescoço do
elefante, penduravam-se no seu rabo, empurravam-lhe as patas, traziam
camundongos para assustá-lo, ofereciam amendoim, mas nada surtia qualquer
efeito. O Valdir era mesmo um elefante muito orgulhoso.
Até que um dia, um rapaz esperto, acostumado a lidar com a
teimosia das mulas, assistindo ao espetáculo decidiu enfrentar o desafio. Ele
era o ponta-esquerda do time de futebol. Tinha uma canhota poderosa. O chute do
rapaz era uma bomba de furar a rede.
- Senhoras e senhores, agora o elefante mais teimoso do
mundo desafia quem possa fazê-lo sentar - anunciou o dono do circo. O rapaz se
levantou e se dirigiu ao centro do picadeiro. Olhou seriamente nos olhos
pequenos e soberbos do animal. Depois passou a rodeá-lo lentamente, como a
procurar um ponto fraco.
Quando estava por detrás do elefante, mandou o pé num chute potentíssimo,
que atingiu em cheio os testículos graúdos do Valdir, que lhe caíam pendurados
entre as patas traseiras. O elefante só teve tempo de emitir um longo e
doloroso "uíííííííííííííííííí!!!", enquanto as patas de trás perdiam
a sustentação e escorregavam, fazendo aquelas toneladas se sentarem no chão.
A plateia delirou e o rapaz recebeu o prêmio. No dia
seguinte, o circo partiu para outra cidade. Eles agora tinham um problema. Como
aproveitar aquele elefante como uma atração que justificasse toda a comida que
lhe custava, e o incômodo de transportá-lo de um lado para outro?
Resolveram mudar a exigência.
Agora, em vez de fazê-lo sentar, o prêmio seria dado a quem
fizesse Valdir falar sim e não. Dessa maneira, estariam seguros de que ninguém
levaria o prêmio. Na primeira noite de espetáculo na nova cidade, com casa
cheia, quando o desafio foi lançado à plateia, o mesmo rapaz desceu da
arquibancada em direção ao picadeiro.
Ao vê-lo, o orgulhoso elefante sentiu um arrepio percorrê-lo
desde a ponta do rabo até a ponta da tromba. Todo mundo já ouviu falar da tal
"memória de elefante". O Valdir lembrava claramente daquele chute de
canhota.
O rapaz olhou firme dentro dos seus olhos e lentamente
começou a rodeá-lo, exatamente como da outra vez.
A cada volta, Valdir suava frio. O jovem se aproximou,
levantou aquela orelha imensa e sussurrou-lhe ao ouvido: Você me conhece,
Valdir? – ao que o elefante de imediato respondeu, movendo a cabeça de cima
para baixo, exprimindo um "sim"!
- Quer levar outro chute daquele? - ao que o elefante
imediatamente movendo a cabeça de um lado para o outro, expressou um angustiado
"não!".
- Então senta Valdir! - ao que o animal prontamente
obedeceu, dobrando as patas traseiras, sentando docilmente.
O público explodiu em aplausos, enquanto o dono do circo,
boquiaberto e a contragosto, pagava o prêmio ao rapaz.
O orgulho é mesmo terrível e nos faz teimosos como o
elefante Valdir. Admirador de si próprio, o orgulhoso não ouve ninguém e se
considera o dono da verdade. Até que chega o dia, aquele dia, em que Valdir
sentou. Melhor e muito menos doloroso é aprender através da humildade.
Tonhão, o humilde elefante africano, que era tido por Valdir
como ridículo, até hoje dá gargalhadas quando se lembra da cara do Valdir.
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